terça-feira, 2 de outubro de 2007

A Marcha da História à Democracia Liberal foi Uma Conquista da Cultura Cristã?

A marcha dahistória à democracia liberal foi uma conquista da cultura cristã?O texto do filósofo ingles Roger Scruton na revista www.revistapronto.com.br sobre Fukuyama revisitado, é dignode atenção sob vários aspectos. Ele nos fazrecordar da famosa tese que ganhou notoriedade na década de 90 e queconsistia numa defesa firme da democracia liberal sob o argumento deque já havíamos visto tudo e agora estaríamos entrando numa espécie defase de hibernação da história, ou melhor, num fim da história. Alguns o interpretaram como um autor banal. Outros, acharam que elequeria nos proteger contra a sedução do totalitarismo. O mundosupostamente pós-liberal seria horripilante, mas ainda assim provavelporque já antes da democracia liberal os seus contornos estavam dadosna indistinção entre poder laico e poder sagrado. O totalitarismoradicaliza o medo do mundo livre e da democracia. O fundamentalismo dosdias de hoje apenas ratifica o que já era sombras lá nos inicios damodernidade iluminada. O que restou disso, Hegel tomou como motivo de reflexão para sustentaro vôo de Minerva. O resultado é: a modernidade consegue fazer tabuarasa de seu itinerario. Com a fenomenologia, tal percurso é saudadocomo movimento para a emancipação. Nele, o espirito se reconhece emseus próprios produtos, finda a alienação e dá-se o recolhimento quandoentão sujeito e objeto se sabem finalmente identicos.Dessa forma, Fukuyama, baseando-se emHegel, localizouna modernidade desencantadaos ultimos suspiros da história humana, era o fim dos percalços e dosideais romanticos e utopicos que haviam animado um conjunto grande deintelectuais inquietos e insatisfeitos, como o Marx, com a modernidade.O próprio Fukuyama hojesabe que isso não é tudo. Na modernidade tardia, o artigo deScrutton ganha mais uma relevancia.Ele reflete sobre essa tese do Fukuyama baseado no visor da crisecultural produzida pela recusa da democracia, do anti-americanismo e dohiato político-iluminista cuja pavimentação agora a Europa unificadasegue ao selar seu destino no fortalecimento da burocracia e nasobreposição de valores coletivos sobre valores individuais.Tudo isso obviamente sob os auspicios daluta contra o terror e naesteira do crescimento dos movimentos anti-ocidente. Alguém disse que oódio cultivado nos guetos academicos do ocidente e nas mesquitasislamicas não é exatamente contra o capitalismo, mas sim contra ademocracia e nosso estilo moderninho de vida, de frenquencia aosupermercado e shoping centers e principalmente de libertinagem sexual.A nova conexão de dominio mundial seria judeus-novaiorquinos contra omundo subdesenvolvido. O anti-semitismo encontra-se agora de mãos dadasao ódio à democracia amaricana.Richard Rorty, na mesma revista, refezas contase disse que a democracialiberal, como irrupção fortuita de valores em circunstanciashistóricas não-previstas, não-planejadas e não-induzidas, estaria agorasob a ameaça dos liberais fajutos que combatem o Estado do BemEstar com chavões velhos de que o distributivismo compromete o estiloamericano de vida. Na verdade, a democracia liberal se fortaleceexatamente na capacidade que tiveram os democratas de reiventar apolitica com base na solidariedade e na generosidade. Aqui Rorty eJurguem Habermas estão juntos no mesmo ponto que fez John Rawls sernotabilizado como defensor aguerrido dos valores democraticos dejustiça eliberdade. Porem, Scrutton, citando IbnKhaldun (1332-1406) e seguindo atese dos ressentimentos nietzschianos, faz recordar que nem tudo deruím que a civilização produziu originou-se da história. Assim, dizele, como pode racismo, xenofobia e tudo o mais, ser de matrizhistórica se já antes da história tinhamos uma propensão aagressividade? dai vem a polemica tese do filosofo ingles: nãodeveríamos creditar na conta da biologia esse caldo comportamental elogo assim, pensamos nós, derivar o ódio à democracia de nossas basesnaturais?Nem Rorty, Habermas ou Rawls, estariamdispostos a confirmar essa tesede matriz nietzschiana. Porem, devemos sim refletir sobre o que faz oocidente ser tão odiado? além obviamente de nosso estilo de vidamoderninho devíamos pensar um pouco sobre as pirotecnias políticas deum Bush e de um Blair para entender como esse ódio biológico que jáhavia antes, agora parece encontrar um campo fértil para proliferar.Mas, somos modernos porque gostamos de ser modernos.A democracia, além de fortuita eesperançosa, é fragil. Sem baseseconomicas estaveis e uma rede distributiva de riqueza, elasimplesmente se torna alvo certo dos sectários e se desmancha no ar.Como pode a democracia sobreviver em tal pantano arenoso?Não pode. Então o caldo culturalocidentallaico e as bases cristãs dademocracia podem sim ser devorados pelas potencias biologicas daespécie reprimidas a séculos em nome da boa convivencia e datolerancia. Tudo o que queremos é saber tolerar os diferentes. Nãopodemos aceitar como principio algo que nos fere em nosso amor próprioou em nosso amor fati. Se Cristo sabia que devíamos recuar,aplacar nossos ressentimentos e suportar nossas diferenças, é poque eletinha boas razões, e razões são sempre iluministas, de apostar as suasfichas numa civilização emancipada. Ainda podemos fazer isso?

Sergio Fonseca

Nenhum comentário: